Samir Berardo, fundador do Muidokan

Pai, marido e cidadão. Tradutor com vários trabalhos publicados, instrutor-chefe do Muidokan Karate Kenkyukai e pesquisador de karate estilo antigo (toude), com ênfase em bunkai (o estudo do significado dos movimentos de kata – foco nos kata do ramo Shurite/Suidi). Samir Berardo é faixa preta em karate Shotokan e taekwondo Kukkiwon, e praticou o karate Shorin-ryu Shinshukan e judo. Ele vive atualmente em Brasília/DF (Brasil), onde dá aulas de defesa pessoal em agências públicas federais e de karate estilo antigo (não comercialmente) em seu dojo particular.


Samir Berardo é karateka, pesquisador, fundador e diretor técnico do Muidokan Karate Kenkyukai (Sociedade Muidokan de Pesquisa do Karate). É natural de Belém/PA e residente em Brasília/DF, onde trabalha em uma agência federal de segurança. Entre outras atribuições, Samir dá aulas de defesa pessoal para servidores desse órgão público. Também tem alunos em Brasília e nos Estados do Amazonas, Espírito Santo, Minas Gerais, Pará, Paraná, Roraima, Rio Grande do Sul e São Paulo. Samir Berardo também ministra seminários com base em sua pesquisa.

Desde jovem, Samir teve contato tanto com as artes marciais quanto com a violência urbana propriamente dita, pela vivência em Belém, uma das cidades mais violentas do mundo. Isso fez com que ele testemunhasse e tivesse muitas experiências, predominantemente desagradáveis, com situações de violência. Apesar desse contexto pouco recomendável, essas vivências acabaram também sendo aprendizados importantes sobre o assunto. “Naquela época também havia muitos valentões. Essa era uma das razões pelas quais eu praticava artes marciais e realmente aprendi muito sobre como lutar na rua contra aqueles valentões para me proteger e, às vezes, para proteger meus amigos. Continuei fazendo isso alguns anos depois, até terminar a escola”, ele conta em entrevista ao Whistlekick Martial Arts Radio. Nesse período de juventude, os principais contatos de Samir com artes marciais foram com capoeira e jiu-jitsu (BJJ), modalidades que praticou (e aplicou quando necessário) por cerca de cinco anos.

Após terminar a faculdade, prestou concurso e foi aprovado na agência federal de segurança onde trabalha até hoje. Foi nessa época, em 2008, que voltou a ter contato com artes marciais, durante os meses do curso de formação do órgão, em Brasília, que incluía treinamento em defesa pessoal. Foi o estopim para que ele retomasse os treinos e nunca mais parasse, se interessando por praticar uma arte marcial funcional. Na época que esteve na capital federativa, teve sua introdução ao karate e treinou de forma entusiasmada com o sensei Antonio Lima Pinto, do Shorin-ryu Shinshukan, que atualmente reside em Manaus/AM.

Voltando ao Pará, como não havia dojo de Shorin-ryu, Samir começou a praticar no antigo dojo de Shotokan do sensei Paulo Afonso (aluno de Yoshizo Machida e histórico lutador de vale-tudo e MMA), no município de Ananindeua (região metropolitana de Belém). Alguns meses depois, mudou-se para Belém, morando a mais de uma hora do dojo onde treinava. Então decidiu, com aprovação do sensei Antonio Lima (com quem seguia mantendo contato e recebendo aconselhamentos), mudar para uma escola de taekwondo tradicional, mais próxima de sua residência. 

A escola de taekwondo era comandada por Edison Mayrinck (aluno de Yong Min Kim), com base técnica Kukkiwon muito reforçada, forte influência do Kong Soo Do (karate coreano) Chang Moo Kwan e pouco enfoque na parte esportiva (olímpica). O treino era basicamente como um Shotokan mais relaxado, com bases mais altas e com kata diferentes (os poomsae), mas feitos com movimentos de Shotokan. Com isso, Samir passou a treinar taekwondo formalmente, e paralelamente continuou treinando Shotokan informalmente, em casa e com amigos do karate.Também começou a pesquisar e aprender os nomes das técnicas em coreano e em japonês, as diferenças de execução dos movimentos entre os estilos e também os kata do taekwondo e do Shotokan.

Com cerca de dois anos e meio de taekwondo, Samir voltou a treinar formalmente Shotokan e Goju-ryu com o sensei Fernando Bastos Neto da Federação Paraense Interestilos, em Belém. Ele tinha decidido que precisava voltar às “origens” da arte para se aprofundar. Seguiu treinando as duas artes formalmente em paralelo. Cerca de um ano depois foi graduado faixa-preta no taekwondo. Durante um período auxiliou na academia dando aulas. Após mais de quatro anos no taekwondo, decidiu seguir praticando apenas karate.

Desde essa época, Samir já pesquisava bastante e não estava satisfeito com o Shotokan moderno, pois estava interessado em um karate mais raiz e menos esportivo, com ênfase em bunkai e defesa pessoal. Ele havia lido os dois primeiros livros do sensei Kousaku Yokota, que despertaram seu interesse. Samir entrou então em contato com sensei Yokota e fez amizade com ele. Sensei Yokota começou a vir regularmente ao Brasil e Samir viajou muitas vezes para treinar com ele, além de participar de seminários de outros professores dentro do Shotokan.

Frustrado com treinos pouco voltados ao karate prático, Samir seguiu conselho do sensei Yokota e saiu do dojo onde treinava, aceitando convite para treinar o currículo da organização que o sensei japonês tinha acabado de fundar, sob a orientação dele pessoalmente todas as vezes que viesse ao Brasil, e também remotamente. Samir Berardo foi então o primeiro membro da organização ASAI (membro fundador 001) no Brasil, escolhido como conselheiro particular de Yokota e representante dele no Brasil. Sensei Yokota também convidou Samir para traduzir um de seus livros, Mitos do Shotokan. A tradução foi publicada em 2017.

Nessa época, Samir teve um desenvolvimento técnico muito grande, pois as aulas particulares do sensei Yokota envolviam um número imenso de detalhes. Samir já tinha montado um grupo de treinos em sua cidade, que também seguia progredindo. Cerca de um ano depois do início do treino sob a orientação direta com sensei Yokota, este propôs que Samir Berardo fizesse exame para faixa-preta com ele, pois Samir já sabia o currículo de faixa-preta do Shotokan JKA e estava treinando também o currículo do Shotokan da ASAI. Ainda considerando que Samir também era faixa-preta de taekwondo Kukkiwon, seria possível validar a graduação pela ASAI, contanto que fosse aprovado no exame para faixa-preta.

Foram pelo menos dois meses de treinos preparatórios, com uma série de correções detalhadas de vários exercícios e kata, que culminaram em uma avaliação extensa e a aprovação de Samir como faixa-preta pelo sensei Yokota. Posteriormente, sensei Kousaku Yokota reconheceu Samir e o sensei Leandre Rosa de Campinas/SP (também membro do Muidokan) como embaixadores e co-presidentes da ASAI no Brasil.

Paralelamente, Samir Berardo já tinha uma pesquisa considerável sobre os fundamentos técnicos do karate, que estava sendo publicada aos poucos e começava a ser respeitada. Ele mantinha (e mantém) contato com pesquisadores estrangeiros como Andreas Quast, Jesse Enkamp, Noah Legel e Mario McKenna, entre outros. Sensei Dan Djurdjevic foi outra grande influência para Samir, inclusive com direções específicas que ajudaram a moldar sua abordagem e método de pesquisa sobre o karate. Samir considera Dan Djurdjevic o mais importante sensei de sua formação, sem deixar de reconhecer a inestimável contribuição dos demais. Sensei Dan Djudjevic também tem estima especial por Samir e respeito por este como artista marcial, o que já foi demonstrado várias vezes ao longo dos anos.

Apesar do que aprendia com sensei Yokota, Samir continuava pesquisando Shorin-ryu e karate de Okinawa e teve aulas com outros sensei dessa linhagem, como um professor que fez parte da escola Kyudokan e com o finado professor Sebastian Rodriguez Valle (Shinshukan), do Rio de Janeiro/RJ, chegando inclusive a dar aulas em seu dojo. Na constante busca pelo retorno às origens do karate, o Shorin-ryu passou a ser o principal estilo de referência de Samir em seus treinos pessoais e do grupo de treinos e pesquisa que já há anos ele mantinha em suas dependências particulares. Apesar dessa ligação forte com o Shorin-ryu, Samir continuava tendo relações amistosas com outros estilos e procurava aprender de todas as fontes possíveis, inclusive com instrutores de vários outros países, utilizando-se para isso de interações online (muitos anos antes de isso ter se tornado comum por causa da pandemia covid-19). Em anos recentes, Samir revisitou também sua experiência com Goju-ryu através do contato com membros da escola Jundokan, o que lhe permitiu completar o conhecimento fundamental do currículo de kata daquela escola. Em seus anos de treino, Samir também teve experiências paralelas com judo e krav magá.

Ao longo desses anos, Samir graduou-se faixa preta em taekwondo e karate Shotokan. Teve também duas oportunidades de reconhecimento de graduação de faixa preta em Shorin-ryu, além da experiência no Goju-ryu, que continua praticando. No entanto, seu interesse em artes marciais sempre foi a respeito do conhecimento prático do karate, independente de questões formais como graduações e, acima de tudo, sem imposição de limites como aqueles dos estilos modernos. Assim como ocorria com os praticantes de karate do período anterior à modernização da arte, Samir aprendeu karate com um grande número de instrutores, com seus estudos pessoais e com sua experiência própria.

Atualmente, Samir Berardo se dedica, além de seus treinos e aprendizado, à sua pesquisa, ao desenvolvimento didático e ao crescimento do Muidokan Karate Kenkyukai. Vale observar que o principal motivo para que Samir tenha alunos é, de fato, que estes são hoje precisamente os principais professores que ele tem (mas ele também segue tendo treinamentos com professores de outros estilos e mesmo de outras disciplinas, como de biomecânica humana). Samir hoje exerce a função de professor, mas antes de tudo e acima de tudo é um estudante de karate, sem limitações e sempre aberto a revisar e expandir sua compreensão. Isso inclui manter um contínuo trabalho de pesquisa histórica, técnica e uma análise extensa do principal legado deixado pelos antigos mestres, os kata, com um trabalho calcado na metodologia científica e testes exaustivos das aplicações. O foco do Muidokan é promover treino de um karate funcional, bem fundamentado e eficiente para defesa pessoal, mas que também proporcione bem-estar e qualidade de vida a seus praticantes.

O trabalho de Samir Berardo e do Muidokan tem qualidade reconhecida internacionalmente por nomes respeitados como Jesse Enkamp (Suécia), Dan Djurdjevic (Austrália), Nicolás Pérez (Okinawa/Colômbia), Orjan Nilsen (Noruega), Noah Legel (Estados Unidos), Miguel Harker (África do Sul), Colin Wee (Austrália) e vários outros.

Seminário em São Paulo, maio/2019